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UMA LUTA DIÁRIA: MULHERES NO FOTOJORNALISMO

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HILDEGARD ROSENTHAL

Image by Ailbhe Flynn

TUDO COMEÇA COM A HISTÓRIA DAS MULHERES NA FOTOGRAFIA

A história do fotojornalismo está intimamente ligada a fotografia

As mulheres tiveram um papel importantíssimo no desenvolvimento das principais técnicas da fotografia, apesar da história só lembrar e citar o nome de homens envolvidos.
E como prova de que essa história não foi escrita só por homens, podemos citar o exemplo de Constance Talbot que, junto com seu companheiro Fox, criou papéis sensíveis à luz que absorviam melhor e mais rápido as imagens.
Ela e outras mulheres aderiram à fotografia como profissão, muitas delas sendo pioneiras em suas áreas de atuação. Ann Cook é um bom exemplo. Foi a primeira pessoa a realizar uma fotografia de paisagem com um daguerreótipo. Antonieta DeCorrevont conquistou o título de primeira mulher a trabalhar com fotografia.
Mas somente a partir do século XX, a fotografia foi reconhecida como uma profissão, além de uma modalidade artística. Nesse período, algumas mulheres se destacaram por suas técnicas, habilidades e papel influenciador nessa área.
As histórias do fotojornalismo e da fotografia andam praticamente juntas. A prática de veicular imagens nos meios de comunicação começou em 1880, em Nova Iorque, através do Jornal Daily.
Mas, o termo "Fotojornalismo" foi apresentado apenas nas primeiras décadas do século XX. Seus primeiros locais de aplicação foram em revistas ilustradas, que misturavam textos com fotos. O auge dessa mídia foi na Alemanha, na década de 30.  Na década de 50, a fotografia já havia evoluído bastante, tanto em aspectos técnicos quanto como arte.
As mulheres tiveram um papel não só importante, mas decisivo na evolução e na história da fotografia. Mas mesmo com os avanços conquistados pela categoria, ainda há muito para conquistar quando o assunto é a valorização do olhar feminino na fotografia.
Assim como acontece em várias profissões, na fotografia também existem alguns estereótipos sobre as áreas de atuação consideradas femininas.
Acredita-se, por exemplo, que as mulheres são mais indicadas para realizar ensaios familiares ou relacionados à maternidade. Isso torna mais difícil a entrada das mulheres no fotojornalismo, que é considerada uma profissão mais arriscada.
Mas algumas fotógrafas vão contra esse pensamento limitado e ganham destaque ao atuar nas mais diversas áreas do fotojornalismo, como guerra, esportes, publicidade e indústria. O que deixa clara a capacidade feminina de criar registros surpreendentes em qualquer situação.

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UMA DAS PIONEIRAS DO FOTOJORNALISMO NO BRASIL:

Hildegard Rosenthal

Hildegard Baum Rosenthal foi a primeira mulher fotojornalista no Brasil. Até a sua adolescência viveu em Frankfurt (Alemanha) e por conta do regime nazista precisou deixar a Alemanha, emigrando para o Brasil em 1937. Em 1938, começou a trabalhar como orientadora de laboratório na empresa de serviços fotográficos Kosmos e ainda naquele ano a Agência Press Information a contratou como fotojornalista. Ela realizou reportagens para jornais nacionais e internacionais.
Suas fotos foram pouco conhecidas até 1974, quando o historiador de arte Walter Zanini realizou uma retrospectiva de sua obra no Museu de Arte Contemporânea da Universidade de São Paulo.
As fotos de Hildegard eram de São Paulo e capturavam o cotidiano da vida urbana: o movimento de pessoas nas ruas, o transporte público, a arquitetura, vendedores ambulantes. Hildegard registrava pessoas desconhecidas e também modelos que simulavam circunstâncias comuns. Suas imagens têm poucos espaços vazios. O negativo enche-se quase totalmente com conteúdos que se apresentam de maneira equilibrada e clara.
Sérgio Bürgi, coordenador de fotografia do Instituto Moreira Salles e comissário da exposição "A São Paulo de Hildegard Rosenthal", afirmou em 2013 que a influência da Bauhaus e do Construtivismo transformaram a maneira de construir a imagem que passou a ser realizada no Brasil a partir dos anos 1940, e que Hildegard Rosenthal fez parte deste movimento de renovação. Ela era pequena, mas muito ousada como jornalista e fotógrafa. Prova disso é que além de seu trabalho de fotojornalista, manteve um constante diálogo através da linguagem moderna de sua produção com artistas contemporâneos no Brasil e na América do Sul.

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A MULHER ALÉM DE ROBERT CAPA

Gerda Taro

Outro grande nome do fotojornalismo é Gerda Pohorylle, conhecida profissionalmente como Gerda Taro. Foi fotógrafa, jornalista e anarquista alemã de origem judaica. É lembrada como sendo a primeira mulher fotojornalista a cobrir uma guerra e morrer enquanto fazia os registros. Foi casada com o fotógrafo húngaro Endre Friedman, mais conhecido como Robert Capa e ficou conhecida principalmente pela cobertura da Guerra Civil Espanhola.
Gerda era judia e perdeu a sua família na época da Alemanha Nazista. Conheceu Endre Friedman que também era judeu, em Paris. Os dois começaram a trabalhar juntos e tiveram a ideia de Endre alegar que era o agente do fotógrafo Robert Capa, alguém que não existia, assim, os dois poderiam tirar fotos e vendê-las como sendo o trabalho de um norte americano, para fugir do preconceito contra judeus na época. Porém, o segredo do casal durou pouco tempo, mas Endre continuou o nome comercial enquanto Gerda adotava o sobrenome de Taro.

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GERDA TARO E ROBERT CAPA

ROBERT CAPA

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Os dois continuaram trabalhando juntos em muitas coberturas, cobrindo diversas guerras e conseguiram várias publicações importantes na época usando a autoria de Robert Capa. Gerda era muito independente e suas fotos começaram a ficar famosas. Ela cobriu o bombardeio de Valência sozinha, registrando momentos que foram alguns dos seus mais famosos trabalhos. Suas fotos foram bastante elogiadas e compradas no mercado internacional, cobria guerras e eventos sozinha, e muitas vezes era a única a testemunhar eventos importantes.
Em 1937, Gerda foi atropelada enquanto cobria a Batalha de Brunet e acabou falecendo com apenas 26 anos. Foi a primeira fotojornalista a morrer em campo de guerra e até hoje alguns duvidam que a morte de Gerda tenha sido acidental, já que as fotos tiradas naquele dia nunca foram vistas.
Gerda foi um nome muito importante no fotojornalismo, mas até hoje vive à sombra de Robert Capa já que seu nome não é tão lembrado quanto o dele.

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DONA DE UMA DAS FOTOS MAIS FAMOSAS DA HISTÓRIA

Dorothea Lange

Nascida em Hoboken,1895, Dorothea Lange começou a se interessar por fotografia aos 12 anos, após ser abandonada pelo pai.

Quando ingressou na Universidade de Columbia, em Nova Iorque, mergulhou de cabeça no universo fotográfico e começou a trabalhar como aprendiz em vários estúdios da cidade, até abrir seu próprio negócio.

Em 1929, com a crise causada pela quebra da bolsa de Nova Iorque, Lange começou a fotografar as ruas. Seu grande talento e sua sensibilidade fotográfica chamaram a atenção de fotógrafos mais experientes, o que a levou a trabalhar para "Farm Security Administration", a FSA, programa criado para promover o desenvolvimento de áreas agrícolas americanas, uma medida política do governo Roosevelt para combater a crise.

Durante o período de 1935 a 1939, Lange retratou o sofrimento dos pobres, dos esquecidos e principalmente das famílias rurais deslocadas e dos trabalhadores imigrantes. Suas fotos eram distribuídas gratuitamente a jornais de todo o país, tornando-se fortemente representativas daquela época.

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"A câmera é um instrumento que ensina a gente a ver sem a câmera"

Dorothea Lange

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A fotografia mais conhecida da época é a "Migrant Mother", ou, "Mãe imigrante", um dos mais icônicos registros da história da fotografia, no qual Dorothea retratou uma imigrante chamada Florence Owens Thompson,com 3 de seus 7 filhos. É o símbolo da Grande Depressão, o pior e mais longo período de recessão econômica do século XX.

De alguma forma, suas fotos denunciavam o preconceito dos norte-americanos, e um dos exemplos disso são as fotos da situação dos japoneses após o ataque a Pearl Harbor. As fotos desse episódio foram tão criticadas que o exército as confiscou.

Lange faleceu em 1965, e em seus últimos anos de vida enfrentou vários problemas de saúde, entre eles, um câncer. Hoje, depois de 5 décadas de sua morte, todo o seu trabalho é cada vez mais reconhecido e estudado nas universidades do mundo todo. Seu trabalho representa uma fotografia com uma crítica social forte e para poucos: a de enxergar além da própria existência.

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equipamento de fotografia

MULHERES NO FOTOJORNALISMO ATUAL

Histórias de lutas e vitórias de mulheres fotojornalistas em um mercado de trabalho onde ser homem já é meio caminho andado. Elas vem lutando e não é de hoje, essa luta começou há muito tempo, por volta de 1944, com mulheres revolucionárias que abriram as portas do fotojornalismo para que outras mulheres pudessem fazer parte desse meio. E mesmo depois de tantos anos, a luta continua.

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"Não podemos esperar ter um corpo de jornalistas responsáveis, se não incluirmos as vozes de mulheres, negros, indígenas, pessoas LGBTQ +, pessoas de origens da classe trabalhadora."

Daniela Zalcman

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PLATAFORMA WOMEN PHOTOGRAPH

Daniela Zalcman, fundadora do Women Photograph

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Tendo em vista esse cenário, a fotógrafa documental Daniella Zalcman criou a plataforma Women Photograph, em 2017, com o intuito de divulgar o trabalho fotográfico de mulheres que não eram contratadas pelos meios de contratação tradicional. “Fiquei frustrada depois de várias conversas com editores de fotografia que diziam coisas como: Eu contrataria mais mulheres se soubesse onde encontrá-las", afirmou Zalcman, que então decidiu construir um banco de dados. “Dessa forma, nunca haveria desculpa para os editores não saberem para onde olhar” diz Zalcman, e desde que a plataforma foi criada o número de mulheres que utilizam essa ferramenta só vem crescendo. Atualmente já tem mais de 1.000 fotógrafas mulheres. Daniella também criou programas para apoiar a comunidade, estabelecendo subsídios para projetos, um programa de mentoria, um workshop anual e também uma equipe para coletar dados sobre contratações e publicações no setor.

Abaixo podemos observar dois dos gráficos que a plataforma deixa disponível com dados de fotos publicadas em jornais internacionais dividas por gênero. O primeiro de 2018, no segundo ano da plataforma e o segundo do terceiro trimestre de 2020. Para mais informações, clique nos gráficos.

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Houve muitas mudanças positivas desde que a Women Photograph foi fundada. A indústria fotográfica tem se conscientizado cada vez mais sobre diversidade e inclusão, e uma das missões da plataforma é mostrar que não podemos ver a história ser contada apenas por uma perspectiva. “É extremamente importante que tenhamos certeza de que nossa comunidade de contadores de histórias visuais seja tão diversa quanto as comunidades que esperamos documentar. Faz tempo que fingimos que os jornalistas são observadores imparciais, mas isso não é verdade. Todos nós somos impactados e informados por nossas identidades e nossas experiências vividas, e trazemos isso para a forma como vemos o mundo e como relatamos sobre o mundo. Não podemos esperar ter um corpo de jornalistas responsáveis, ​​se não incluirmos as vozes de mulheres, negros, indígenas, pessoas LGBTQ +, pessoas de origens da classe trabalhadora. Portanto, espero que continuemos a resistir à maneira como o fotojornalismo tem operado historicamente e que continuemos a melhorar como indústria” explica Zalcman.


A Women Photograph entrou nesse time de mulheres, que estão nessa luta há quase um século batalhando por espaço, por salários iguais, por reconhecimento, por respeito e mais empatia pelo seu trabalho.  A seguir algumas fotos da plataforma.

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Em entrevistas com algumas fotojornalistas de peso aqui no Brasil conseguimos entender um pouco mais sobre o lado delas nesse mundo que ainda é visto como masculino. Mas será que ainda é tão masculino pelo preconceito e pela falta de oportunidade que as mulheres enfrentam ou será que poucas mulheres optam por essa área? É o que vamos descobrir a seguir.

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"A magia do fotojornalismo está nas pautas variadas, na possibilidade de estar em lugares e situações tão diversas, cobrir eventos esportivos, shows de quem eu admiro, por exemplo, faz eu me sentir muito privilegiada. Mas o que me completa como fotojornalista são dois pontos que podem parecer antagônicos: as pequenas pautas, que impactam na vida de poucas pessoas, e a chance não somente de assistir, mas de registrar grandes eventos históricos, sejam sociais, políticos, esportivos, entre outros. Ver a história acontecer e ser parte de quem conta o que e como aconteceu é mais que uma honra, é um exercício diário de responsabilidade e humildade”

Carla Carniel

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CARLA CARNIEL

Carla Carniel é fotojornalista desde 2014, com experiência em hard news, grandes coberturas, eventos sociais, esportivos, políticos e reportagens especiais.

Carla conta que fez um curso de fotografia básico, mas que serviu para despertar sua vontade de explorar mais a área. No início ela estava aberta a trabalhar em qualquer área da fotografia, mas não conseguiu fugir de todas as possibilidades do fotojornalismo, a dinâmica, a adrenalina, a pressão, tudo isso somado a formação que ela já tinha e ao que os professores diziam sobre o seu perfil, não podiam levar a outro caminho, embora não tenha sido uma vontade ou um sonho que ela trouxe desde sempre, mas acabou sendo natural.


Conta que não sofreu preconceito de forma direta e declarada, mas de forma sutil. Os fotógrafos do gênero masculino tinham privilégios do tipo: ter a preferência para escolher o que fariam e quando fariam. E isso valia para profissionais que estavam lá a menos tempo que ela, ou seja, não era apenas por uma questão de hierarquia interna. “Na época eu nem tinha tanta noção quanto hoje. Olhando para trás e entendendo que a relação entre ‘os caras, os amigos’ era fundamentada principalmente na questão de gênero” explica.


Carla ainda relata que como fotojornalista já encarou atos de colegas que para ela são reflexo da sociedade machista, como colegas achando que estavam sendo simpáticos, mas estavam diminuindo-a, como se ela não fosse capaz de fazer o mesmo trabalho que eles. Discutiu em um grupo online com colegas que ofendiam pelas costas outra fotojornalista de forma pessoal e cruel, e a resposta que ouviu foi: "Desculpa, não sabia que havia mulher neste grupo”, ela saiu do grupo na certeza de que o pensamento ainda era o mesmo entre eles, e devem ter falado ainda pior dela.


Quando questionada se o fotojornalismo ainda era uma profissão vista como masculina, Carla disse o seguinte: “Ainda sim, mas sinto que isso vem mudando principalmente de uns dois anos para cá, não tanto em números ainda, mas em visibilidade. Algo que reparo desde que entrei na área é que a quantidade de homens atuando é obviamente bem maior, mas a proporção de qualidade, não. Todas as mulheres que conheço na área tem um nível alto de excelência, e são uma inspiração diária, enquanto entre os homens é muito mais fácil permanecer no mercado mesmo com padrões baixos de qualidade. O entendimento que fica é que as mulheres só sobrevivem no fotojornalismo se forem realmente competentes, sem brechas para quem precisa se desenvolver, enquanto o mercado abre muito mais precedentes para os homens”.

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Em uma sociedade que vem evoluindo a passos lentos para padrões menos machistas, em que as redes sociais facilitam a visibilidade dos trabalhos, as chances estão aumentando. Carla contou que no último ano teve contato com três grandes empresas de jornalismo, e ouviu dos próprios editores (dois homens e uma mulher) que estão em busca de diversidade para suas equipes, principalmente de mulheres e pessoas negras. Isso abre as portas para quem antes não teria essa oportunidade, e faz com que jovens, parte das minorias, se enxerguem no futuro ocupando essas posições, sabendo que é possível.


Na ARFOC (Associação de repórteres fotográficos e cinematográficos no estado de São Paulo) a porcentagem de mulheres é de 11,03% contra 89% de homens. Em 2018, a plataforma Women Photograph apontou que 15% dos fotojornalistas do mundo são mulheres, mas com a mudança de postura que vem ocorrendo nas chefias, devemos ter um número maior nos próximos anos, não somente na ARFOC, mas nas redações, agências e principalmente cargos de tomada de decisões.


"A magia do fotojornalismo está nas pautas variadas, na possibilidade de estar em lugares e situações tão diversas, cobrir eventos esportivos, shows de quem eu admiro, por exemplo, faz eu me sentir muito privilegiada. Mas o que me completa como fotojornalista são dois pontos que podem parecer antagônicos: as pequenas pautas, que impactam na vida de poucas pessoas, e a chance não somente de assistir, mas de registrar grandes eventos históricos, sejam sociais, políticos, esportivos, entre outros. Ver a história acontecer e ser parte de quem conta o que e como aconteceu é mais que uma honra, é um exercício diário de responsabilidade e humildade”


Segundo Carla, nós mulheres conseguiremos ter igualdade em relação aos homens, olhando para a sociedade, já conquistamos pequenos avanços, essa igualdade está num futuro próximo. Mas não basta apenas equiparar homens e mulheres se não houver um recorte de classe, raça, gênero, identidades sexuais, enfim, uma forma de que as minorias sejam representadas no mercado. Se esse movimento não for interseccional, vamos criar apenas mais um nicho excludente.

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"Mas é uma questão de ganhar espaço mesmo, como foi acontecendo com outras profissões, até que a sociedade tem que aceitar que tem mulher que faz as coisas de igual para igual, e que aguenta o tranco e que faz fotos incríveis, mas isso é um processo."

Monica Alves

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Monica Alves por Luis Blanco

MONICA ALVES

A fotojornalista Monica Alves concorda que existe um preconceito principalmente com as mulheres que trabalham em campo. Ela conta que quando começou, o pessoal literalmente ia afastando, empurrando-a para o lado e ela tinha que se impor. Então, é nesse sentido que tem que ter força física e mental, e não só uma foto boa. "No começo, é muito difícil eles te aceitarem, é um ou outro que está disposto a te ajudar, a maioria nem olha na tua cara, porque eles já têm a panelinha deles e quando você chega, você é colocada de lado, ignorada, não que isso não aconteça com os homens, mas com as mulheres é muito pior. Então você tem que se mostrar forte em todos os aspectos, além da sua foto ser boa. Já para um homem, basta a foto ser boa", afirma Monica.


Conta ainda que muitas mulheres tentam entrar nessa área, mas é difícil conseguir uma contratação fixa em um jornal e quem trabalha com freelance em agência, como ela mesma trabalhava, fica muito difícil conseguir pagar as contas, "no caso de mulheres que tem que sustentar a casa e os filhos e trabalham para agências e portais que fazem pacotes que pagam 7 reais em uma foto, isso é ridículo, ainda mais para quem cobre hard news, onde você arrisca sua integridade física, arrisca seu equipamento" explica Monica. Ainda comenta que a rotina acaba sendo muito pesada para mães solteiras, já do lado dos homens acaba sendo bem diferente, temos que considerar a diferença de rotina entre homens e mulheres no ambiente familiar dentro da sociedade machista em que vivemos.


O número de mulheres trabalhando como fotojornalistas contratadas em redações é muito pequeno, "mas é uma questão de ganhar espaço mesmo, como foi acontecendo com outras profissões, até que a sociedade tem que aceitar que tem mulher que faz as coisas de igual para igual, e que aguenta o tranco e que faz fotos incríveis, mas isso é um processo".

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"É uma coisa que você sente, não é assim alguém que vai te falar"

Ale Cabral

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ALE CABRAL

Ale Cabral, a fotojornalista oficial do Comitê Paralímpico do Brasil, conta que no começo tudo foi um pouco complicado. A dificuldade de ser objetiva nas pautas, de pegar os "macetes", de fazer tudo muito rápido, de falta de recursos, tudo aquilo que se sente quando começamos algo novo, mas com muita coragem e persistência ela foi pegando experiência e evoluindo.
Ela percebeu logo no começo que gostava mais da área do esporte. Depois de 2 anos pegando pautas de rua, foi para o futebol e lá sentiu o preconceito por ser mulher. "É uma coisa que você sente, não é assim alguém que vai te falar", ela sentia que para ela, os olhares dos seguranças eram sempre diferentes, com mais desconfiança. Afirma que "segurança na entrada dos clubes, dos treinos eles pedem as credenciais para ficar olhando pra ver se você é mesmo aquela pessoa que você tá falando que você é, e eu sei que isso é porque eu sou mulher entendeu, é horrível". Mas com o tempo, como as pautas do futebol são sempre nos mesmos lugares, as pessoas começaram conhecê-la e perceberam que ela não desistiria. "Com o tempo você consegue também o respeito dos colegas, eu acho que a desconfiança vem também por você ser uma pessoa nova que tá parecendo ali, às vezes tem muita gente que aparece, some, não continua fazendo né, futebol ou esporte e eu continuei fazendo e sempre fui evoluindo" completa.
Para Ale Cabral, a questão da diferença entre homens e mulheres dentro do fotojornalismo é mais estrutural. "No início, acho que menos mulheres e mais homens eram dispostos a isso e pela nossa educação mesmo que é muito machista né, mulheres são criadas para serem mais protegidas sabe, e acabam se tornando pessoas inseguras e não tem o ímpeto de repente de ir atrás de uma coisa que ela realmente gostaria de fazer e não fazer uma coisa que é o que as pessoas esperam delas". Mas mesmo com essa diferença entre os gêneros, ela acredita que estamos evoluindo nesses casos e que o número de mulheres vêm crescendo durante os anos.
Ale Cabral acredita que o mundo do fotojornalismo está se abrindo para as mulheres. Ainda conclui a entrevista dando um recado para as novas fotojornalistas que estão por vir: " Vai fundo, o melhor de tudo é sempre você tentar estar mais informada possível, cultura e leitura são muito importantes na formação da gente porque o fotojornalista sempre faz a foto com a sua cabeça, muito mais do que com o seu equipamento né. Então é com o seu olhar, com a sua crítica, com a sua opinião, isso acaba saindo no seu trabalho e ao longo do tempo você vai desenvolver seu estilo, você vai ver o que gosta mais e vai desenvolvendo essa confiança ao longo do tempo e se conhecendo como profissional".

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Nair

NAIARA PONTES

Naiara Pontes consegue sentir o machismo bem claro dentro do fotojornalismo. "No começo eu era muito insegura, e achava que este tratamento desrespeitoso era o padrão. Mas depois comecei a perceber que os homens entre eles se tratam diferente, com muito mais respeito e cuidado. Daí percebi que sim, também era machismo aquilo que eu vivia".

Ela trabalhava com eventos políticos e percebia que quase sempre era a única mulher no ambiente e isso se dá principalmente pelo fato de as mulheres ainda serem vistas pela falsa impressão de fragilidade e também, é claro, pelo fato da sociedade machista ainda fazer com que as mulheres tenham que priorizar a casa e a família. “Não é uma profissão muito fácil, sem horários definidos, muitas horas de trabalho. Os homens são maioria porque por trás deles certamente tem uma mulher que cuida da casa, dos filhos e eles conseguem se dedicar a profissão. Conheço muitas mulheres que saíram do fotojornalismo quando tiveram filhos ou se casaram pois não conseguem manter a mesma dedicação de antes" afirma Naiara.

Infelizmente, Naiara sentiu o machismo na pele e nos deu um depoimento sobre um desses momentos: 

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Ela acredita que a evolução das mulheres dentro do fotojornalismo está acontecendo, mas gradualmente, "eu vejo que as coisas começam a mudar, mas ainda há um longo caminho pela frente. Vejo amigas já sendo indicadas a prêmios e promoções na empresa que trabalham, mas as indicações ainda são majoritariamente masculinas. Acho que isso se deve também porque eles ainda são maioria esmagadora neste mercado" afirma Naiara. Ela acha que isso vai ser mudado ao longo dos anos com mulheres unidas e mais fortes através de coletivos e ações que coloquem essas mulheres em destaque: "Uma mulher sozinha acha que não consegue mudar muita coisa, mas quando encontramos outras com problemas semelhantes vemos que sim, é possível e isso é de uma potência enorme. O papel dos coletivos femininos como o 'Mamana Foto Coletiva' e 'Yvy Mulheres da Imagem' tem grande impacto nessa evolução". 

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"A falta de valorização do trabalho da mulher leva ao pouco engajamento na sua identidade de classe. A sensação de pertencimento, o reconhecimento por parte da sociedade, ajudaria a consolidar a sua escolha profissional."

Eneida Serrano

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ENEIDA SERRANO

Eneida Serrano cursou jornalismo na Faculdade de Comunicação da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, em Porto Alegre. Ela ficou encantada pelo fotojornalismo no terceiro ano da Faculdade de Comunicação. Achou uma experiência incrível o trabalho no laboratório, teve a oportunidade de construir um em sua casa e se entusiasmava com a possibilidade de viajar fazendo registros com uma câmera.
Eneida conta que percebeu que estava em um ambiente de trabalho reservado aos homens, quando entrou para o departamento fotográfico do jornal Zero Hora, em 1975. Foi lá que ela percebeu que algumas pautas que davam status para o fotógrafo, só eram feitas por homens, como o futebol. Nesse momento ela também descobriu que em outras empresas como, por exemplo, no Correio do Povo, mulheres fotógrafas nem eram aceitas.
Ela conta que não sofreu assédio, mas sentia que a profissão de repórter fotográfica não era valorizada, como a de repórter de texto. "Lembro de uma vez que, ao chegar sozinha para cumprir uma pauta, a pessoa que me recebeu perguntou: Não trouxe o teu fotógrafo? Assim, como se eu fosse a repórter e o fotógrafo fosse uma bolsa, ou qualquer coisa que viesse com o(a) repórter. Isso não é grave, é até engraçado, mas mostra que se tem a expectativa de que o fotógrafo seja um homem".
Entretanto, nos dias atuais, Eneida tem a visão de que uma mulher fotojornalista não é mais tão fora do comum. Porém, acredita que o machismo e a dominação masculina existem em todas as áreas e por isso acredita que temos que enfatizar as conquistas femininas: "a falta de valorização do trabalho da mulher leva ao pouco engajamento na sua identidade de classe. A sensação de pertencimento, o reconhecimento por parte da sociedade, ajudaria a consolidar a sua escolha profissional".
O fotojornalismo mudou muito, o jornalismo audiovisual e as redes sociais trouxeram uma mobilidade e um alcance gigante para as notícias. Eneida está afastada do jornalismo gráfico, que era sua área de atuação, e a impressão que ela tem é que a maior mudança nos últimos anos foi a qualidade, que baixou muito, dos antigos veículos de comunicação. As mudanças ocorrem muito rapidamente, e os veículos de comunicação precisam se adaptar sem deixar de investir no conteúdo. Por outro lado, o leitor também tem que se readaptar às mudanças desse mundo digital e saber onde procurar a informação de que ele precisa.
Quando perguntei o que ela diria para mulheres que estão começando no fotojornalismo ela disse: "Estudem e se informem constantemente. Mantenham-se atentas às mudanças, que são muito rápidas, e preparem-se pra enfrentar novos desafios sempre. As soluções ou respostas não são definitivas. Creio que a singularidade, ou a autenticidade, de cada profissional, é o que tem mais valor inclusive para conquistar, ou criar, um novo lugar no mercado profissional."
Em conversa e pesquisando sobre sua trajetória de vida e carreira, pude perceber a sensibilidade e o olhar muito além do óbvio que Eneida traz para suas fotografias, fazendo assim trabalhos que inspiram e nos levam a enxergar uma nova perspectiva.

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“Lembro que uma vez me ofereci para ajudar a Renata levando a bolsa. Mas ela não gostou muito. Falou, rindo com ironia, que se não conseguisse carregar o equipamento, seria melhor mudar de profissão."

Sergio Branco

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Sérgio Branco por Ignácio Costa

SERGIO BRANCO

Esse é um assunto que envolve mulheres fotojornalistas e editores, para saber um pouco mais sobre a visão deles, conversamos um pouco com Sergio Branco, editor da revista Fotografe Melhor.


Sergio começou no Jornalismo em 1980, aos 19 anos, no Jornal Hoje, em Campinas (SP) quando havia pouquíssimas mulheres nas redações. Sergio passou ainda nos jornais Correio Popular e Diário do Povo na mesma cidade e nesse período não trabalhou com nenhuma mulher fotojornalista. “Simplesmente não havia, só jornalistas mulheres e poucas".

Ele só passou a trabalhar com mulheres fotojornalistas quando foi contratado como repórter da Folha de São Paulo, no final de 1984, Avani Stein e Renata Falzoni, "duas mulheres de muita personalidade, prontas para enfrentar qualquer piadinha dos homens, que era o máximo que acontecia naquela época" segundo Sérgio.

Sergio lembra que elas sofriam para carregar os equipamentos que eram mais pesados antigamente e ainda recorda um caso “Lembro que uma vez me ofereci para ajudar a Renata levando a bolsa. Mas ela não gostou muito. Falou, rindo com ironia, que se não conseguisse carregar o equipamento, seria melhor mudar de profissão. Então, a partir daí, fiquei na minha”.

O mercado do fotojornalismo até o final de 2000 ainda era bastante restrito para as mulheres, e ainda hoje o meio do fotojornalismo é bem machista apesar de ter melhorado nos últimos cinco anos. Sergio edita há 11 anos um livro-coletânea que se chama "O melhor do Fotojornalismo Brasileiro", além de ser diretor de redação da revista Fotografe há 19 anos. No livro, há uma grande predominância dos homens, pois é o retrato do mercado. Mas Sergio conta que sempre se esforçou para ter mais mulheres participantes e segundo ele, a edição desse ano deve bater um recorde, com o maior número até hoje. Tanto que a edição de Novembro (edição 290) desse ano é totalmente dedicada a mulheres que fotografam.

Como conhece o mercado de fotografia como um todo, Sergio garante que hoje as mulheres estão ganhando mais espaço do que os homens em vários segmentos. Segundo ele, o fotojornalismo é um mercado que regrediu como um todo, para mulheres e homens. “Tenho várias amigas fotojornalistas e o que percebo é que mais homens do que mulheres deixaram o fotojornalismo nos últimos anos, não fiz nenhuma pesquisa, é uma percepção. O que me parece é que as mulheres que ganharam espaço nas redações são mais valiosas profissionalmente do que os homens.”

Quando perguntado sobre o porquê os editores contratam mais homens do que mulheres Sergio solta:"Acho que ainda é a máxima do “sexo frágil”, uma baboseira em um mundo cada vez mais feminino. Não há outra explicação."

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Foto por Paula Lira.

A CORAGEM REGISTRADA PELA ETERNIDADE

Em um campo que exige coragem como um ponto principal, as mulheres têm se destacado cada vez mais: o jornalismo de guerra. Por isso, uma exposição chamada In prima linea - Donne fotorepórter in luoghi di guerra (Na linha de frente - Mulheres fotojornalistas em locais de guerra) na Itália criada pela fotojornalista Andreja Restek contempla justamente fotos registradas por mulheres em campos de batalhas ou em países atravessando as dificuldades de conflitos e guerras civis sem fim.

São fotógrafas do mundo todo que passam por: ameaças, tiros, bombas, fugas, roubos, acusações de espionagem, assédio sexual, ameaças de sequestro e lutas reais pela própria vida para registrarem e mostrarem para o mundo o horror das batalhas de guerras que acontecem nos dias de hoje. E as imagens ainda tem apuro estético, beleza e o mais importante, sentido de denúncia. As fotos a seguir pertencem a exposição e foram registradas pela força e coragem femininas.

A exposição foi dedicada a memória de Camile Lepage, uma fotógrafa francesa morta durante um conflito na república centro-africana em 2014.

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A LUTA CONTINUA

E continua cada vez mais forte com mulheres independentes e que sabem o que querem. As mulheres vem conquistando o seu espaço com muita luta, garra e coragem para que as mudanças aconteçam e continuem acontecendo. Conseguimos enxergar na sociedade de hoje uma grande evolução e união das mulheres nas profissões. E por mais que enfrentem dificuldades, elas resistem!

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SOBRE A AUTORA

Paula Lira, 30 anos, estudante de Jornalismo e amante da fotografia. Estudar sobre essas mulheres é muito inspirador e poder compartilhar todas essas lutas com outras pessoas é um prazer. Sou fotógrafa amadora e arrisco deixando a minha marca através da fotografia.

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